O ensinamento do Buda e seus impactos econômicos

De Prof. Manik Lal Shrestha, Gorkhapatra, Nov 4, 2007

Kathmandu, Nepal — Os ensinamentos e pensamentos do Buda são frequentemente descritos como pensamentos dialético-filosóficos, religião pacifista e ensinamentos estóicos.

Fredreich Engels, co-autor de “O Manifesto Comunista”, chamou o Buda “um dentre os primeiros dialéticos na história da humanidade”. Todas as descrições são sobre os aspectos religiosos ou filosóficos dos ensinamentos budistas.

O aspecto econômico dos ensinamentos do Buda, particularmente o impacto econômico dos seus ensinamentos na sociedade do seu tempo e logo depois são significativos.

Propriedade

Buda foi o primeiro dentre os pensadores antigos do Sul da Ásia que acreditava na vantagem do direito de propriedade coletivo.
Ele até mesmo acreditava que a origem da propriedade privada foi degradante e desonesta. Ele explicou em claras palavras que “No começo os seres humanos possuíam propriedades coletivas e trabalhavam coletivamente nas terras das fazendas na produção de arroz. Mais tarde, dividiram as terras e as lavraram separadamente, dando origem à propriedade individual.

Então, algumas pessoas gananciosas roubaram ou invadiram o pedaço de terra de outras pessoas. Para que esse tipo de prática vil fosse interrompida, as pessoas escolheram um rei e confiaram a ele a tarefa de preservar a paz e a ordem, em especial a tarefa de proteger a propriedade individual da infração alheia” (Agañña Sutta – Digha Nikaya 27).

Esse ensinamento do Buda sobre o desenvolvimento da primitiva sociedade humana reflete sua crença de que a propriedade privada tem sua origem na desonestidade, vício e decadência da moralidade social. A propriedade privada não só se origina do vício, mas também gera o mal, pois ela compeliu os seres humanos a ficarem debaixo da autoridade de um rei e a aceitarem voluntariamente a servidão. O Buda também explicou que no começo os homens confiaram ao rei a tarefa de proteger as pessoas do risco do “roubo de suas terras e propriedades”, mais tarde, com o desenrolar do tempo, os próprios reis roubaram a propriedade do povo.

Sobre a propriedade privada, o Buda disse explicitamente que ela é a fonte de “traições, desequilíbrio (pesagem), fraude na medição, suborno, ingratidão, conspiração, assaltos, massacre, escravidão, roubo, pilhagem e assassinato”. O Buda não só falou das vantagens da propriedade coletiva, mas também aplicou-a na Sangha (irmandade dos monges). Ele permitiu aos monges possuírem individualmente apenas certos objetos pessoais (limitadas a 8 itens de 6 tipos), a saber, 3 chivar (mantos dos monges), 1 fio e agulha, 1 astava, 1 elo de cintura e 8 filtros de água.

Quando a mãe de criação do Buda, a monja Prajapati quis presentea-lo com um Chivar feito por ela e pelas mulheres, o Buda pediu que ela não o oferecesse a um indivíduo, mas à Sangha (Dakkhiṇāvibhaṅga Sutta – Majjhima Nikaya 142).

Mas esse “comunismo econômico” ou experimento de propriedade socialista do Buda não vingou porque ele o aplicou apenas em sua Sangha (apenas entre os monges) e não na sociedade toda, pois o Buda não tentou reestruturar ou transformar a sociedade com o fim de aplicar seu conceito de propriedade coletiva e também porque ele promoveu a propriedade comum apenas entre os pertences pessoais dos homens e não entre os meios de produção.

Além disso, o insucesso do Buda em transformar a sociedade de acordo com suas visões foi atribuído ao fato de que o Buda (624-544 a.C) viveu na idade da “transição da sociedade escravista para a sociedade feudal” e numa sociedade altamente estagnada do Sul da Ásia, na qual as sementes de suas avançadas ideias não poderiam germinar. As visões altamente iluminadas do Buda influenciaram muitos pensadores individuais, mas não puderam modificar as relações econômicas da sociedade do seu tempo.

Apesar dessa insuficiência, os ensinamentos do Buda tiveram um grande impacto no pensamento da sociedade de seu tempo e também em certas frações da sociedade até hoje. A Sangha (irmandade de monges) no budismo de todas as escolas promove o direito comunal à propriedade privada na Sangha, segundo a qual os membros da Sangha (ou monges) trabalham para ganhar não para si mesmos, mas para a Sangha.

Para os leigos, o budismo enfatiza o ganho de dinheiro “para manter a vida e não acumular riqueza”. Para as pessoas de classes abastadas, o budismo pede que a riqueza seja usada para o benefício e bem estar da comunidade. Na época do Buda, seus ensinamentos contribuíram grandemente para diminuir a dureza da exploração feudal, embora não para aboli-la. O Buda louvou e até mesmo instou os ricos a ajudarem os pobres e, portanto, contribuiu em alguma medida para estreitar a discrepância entre possuidores e despossuídos. Durante sua vida, o ideal do Buda teve impacto na atitude econômica da sociedade na área em que ele e seus discípulos trabalharam (sul do Nepal e norte da Índia), onde muitas pessoas ricas foram inclinadas a oferecer liberalmente para a caridade. Seus ensinamentos também restringiam “em grande parte, comportamentos inescrupulosos de ganhar riqueza por meios imorais”. Os ensinamentos do Buda influenciaram os governantes de alguns reinos e repúblicas do seu tempo e de alguns séculos após sua época, que adotaram com entusiasmo medidas para amenizar o sofrimento dos pobres. O rei Ashoka, o governante do vasto território do norte da Índia, tentou implementar os “princípios de um estado de bem-estar”, protegendo “os idosos, os enfermos, as viúvas e os órfãos”.

Os ensinamentos do Buda inspiraram e influenciaram as políticas de alguns governantes posteriores como o rei Shongtsong-gempo, o Rei Munetsongpo e o Rei Shiv Singh Malla de um principado do Nepal (do final do século 16), que tentou se tornar um protetor dos pobres e deficientes. Ainda hoje, Shiv Singh Malla se mantém uma lenda no Nepal, onde a política de proteção do Estado e o Estado para o bem-estar das pessoas são chamados de dias felizes de Simsim Raja.

 

Igualdade

Menção especial pode ser feita ao rei Munetsongpo (846-847) do Tibete, que assim que subiu ao trono em 846 tentou impor “distribuição igualitária de riqueza” entre todos os seus súditos, o povo pobre do Tibete. Declarando que ele estava implementando os ensinamentos do Buda, ele apreendeu a propriedade de todos e a redistribuiu igualmente entre todos os seus súditos. Depois de certo tempo, descobriu-se que as pessoas preguiçosas e pródigas gastaram em demasia e tornaram-se novamente pobres, enquanto as pessoas trabalhadoras e econômicas se tornaram prósperas.

Demasiadamente entusiasmado em promover a igualdade, ele novamente tomou a riqueza de todos e a redistribuiu igualmente entre todos. Depois que ele repetiu o processo três vezes em um ano, ele ganhou o ódio de muitos. Ele era um importante e irracional “nivelador entusiasta”, mas seu exemplo mostra o enorme impacto das idéias do Buda sobre o pensamento econômico e o comportamento das pessoas.

Isso aconteceu por volta de 1400 anos após a vida do Buda, numa época em que os missionários budistas do Nepal e da Índia propagavam a mensagem do Buda no Tibete e em muitos outros lugares da Ásia.

Texto original: https://www.buddhistchannel.tv/index.phpid=8,5332,0,0,1,0#.XTPnOsZWs0N

Tradução: Tiago da Silva Ferreira

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